sexta-feira, 25 de junho de 2010

Entrevista: Pedro Emanuel

“"Agora vão ter de me chamar mister..."

PEDRO MARQUES COSTA

No primeiro ano como treinador, Pedro Emanuel está muito perto de conquistar o título nacional de sub-17, faltando uma vitória no jogo de amanhã com o Sporting, a realizar no Olival (11h00). Depois desta experiência "fantástica" na formação, o novo "mister" prepara-se para abraçar outra não menos entusiasmante na equipa principal. Nesta entrevista, Pedro Emanuel mostrou mais do mesmo: ponderação, inteligência e humor no rescaldo do primeiro ano como treinador e antecipando já o futuro como adjunto de Villas-Boas.

Depois da experiência nos sub-17, segue-se a equipa principal: como encara o facto de ser assistente de um treinador ainda mais jovem do que você?

O presidente, na apresentação do novo treinador, disse tudo aquilo que penso sobre o assunto: mais importante do que a idade é a qualidade. Estou entusiasmado, porque reconheço um grande potencial ao futuro treinador do FC Porto. Da minha parte, prometo o mesmo de sempre; estarei envolvido naquelas que forem as necessidades da equipa, da mesma forma que o fiz enquanto jogador, ou agora, nas funções que desempenho actualmente. O que me move é a paixão pelo jogo e por aquilo que posso aprender diariamente. Tenho a certeza de que posso contribuir para o sucesso da equipa, mas também tenho a certeza de que vou aprender bastante na próxima etapa da minha vida.

Que recordações guarda de André Villas-Boas quando ainda era jogador e ele auxiliava de José Mourinho?

No FC Porto há sempre uma pessoa ligada à parte da observação e esse era o seu papel naquela altura. A nossa relação esteve muitas vezes focada naquilo que eram as necessidades para um jogo ou para um determinado adversário. Falávamos muitas vezes na preparação dos jogos e ele ajudava-nos a esclarecer determinadas situações. Tínhamos uma relação boa e, apesar da sua juventude, sempre demonstrou ser um grande profissional. É uma pessoa tranquila e discreta, duas qualidades que aprecio.

E como vai ser reencontrar antigos companheiros agora no papel de treinador?

Vai ser engraçado. Trabalhámos vários anos como colegas, mas, agora, eles vão ter que me chamar de 'mister' [risos]. Dou-lhe um exemplo semelhante: quando comecei a jogar futebol, o Alfredo era meu companheiro no Boavista; uns anos mais tarde, ele integrou a equipa técnica. Éramos, e continuámos a ser, grandes amigos, mas quando chegávamos ao clube sabíamos que cada um tinha as suas funções. Respeitei-o sempre. Vai ser igual, porque as coisas não se confundem. Quando estivermos cá fora, continuaremos a ser amigos e a brincar da mesma forma, mas lá dentro, a trabalhar, o nível de exigência será outro, assim como as minhas responsabilidades. Estou certo de que eles vão perceber isso facilmente. Caso contrário, estarei disponível para os esclarecer sobre o assunto.

Pegando um pouco nesta experiência nos sub-17, que tipo de treinador é o Pedro Emanuel?

Não mudei, sou igual ao que era enquanto jogador. Sou uma pessoa tranquila e que gosta de ter um bom relacionamento com o grupo de trabalho, factor que para mim é fundamental. Aqui, nos sub-17, os jogadores sabem que podem falar comigo sobre tudo. Tento passar-lhe os ensinamentos que tive durente anos e explicar-lhes a melhor forma de trabalharem os aspectos menos positivos. Para além disso, gosto de ver bom futebol, gosto que os jogadores retirem prazer do jogo, gosto que a minha equipa tenha a bola... E nestas idades, é importante introduzir o divertimento dentro da responsabilidade.

O que o motiva na carreira de treinador?

A paixão pelo futebol, sem dúvida, mas também o facto de querer aprender tudo aquilo que o futebol ainda me pode ensinar. Para além disso, tenho uma grande paixão por esta relação humana que existe, não só a nível individual, mas também a dinâmica de um grupo de trabalho, porque sou uma pessoa extremamente sociável. Sou muito exigente naquilo que faço, mas também tenho uma grande paixão pela minha profissão.

Quais são os seus planos e sonhos a médio/longo prazo?

Todos traçamos os nossos objectivos e eu também tenho os meus, mas nunca fui pessoa de subir dois degraus de cada vez. Quero preparar-me bem para o futuro, evoluir de uma forma sustentada e pensada, porque gosto de dominar muito bem aquilo que faço.


"Temos de vencer em casa e esperamos muita gente"

Vai jogar para o título no primeiro ano como treinador. Qual é a sensação?

Comecei um novo ciclo na minha vida da forma como queria: pela formação de um clube que conheço bem. Todos os treinadores ficam a ganhar se passarem pela formação. Vim encontrar um grupo fantástico, muito solidário, dedicado e à imagem do FC Porto: querem vencer e melhorar todos os dias. É óptimo chegar à última jornada e estamos numa posição em que, se vencermos o jogo com o Sporting, somos campeões.

Que expectativas tem para o jogo com o Sporting?

Jogamos em casa e temos de vencer. Espero que este jogo entusiasme os adeptos e que esteja muita gente no Olival, porque os jogadores gostam de ver o seu trabalho reconhecido.

Há ensinamentos que retira desta experiência...

Aprendi muito. Ainda ontem, na conversa que temos diariamente, disse isso aos jogadores. Estou aqui para os ajudar, mas também para receber o muito que eles me podem ensinar. Trabalhar com jovens de 16/17 anos tem sido fantástico e eles percebem que estão aqui para evoluir em todos os aspectos, não só técnicos, tácticos ou físicos, mas essencialmente como homens. Para nós, é muito importante que eles também tenham sucesso na escola. Se forem jogadores profissionais é óptimo, mas se não conseguirem, podemos orgulhar-nos de lhes termos dado todas as condições para eles se prepararem para as exigências da vida.

É mais fácil comandar um grupo de miúdos ou de seniores?

É completamente distinto. Temos de ter cuidado com a forma como falamos com os mais novos, porque estão moldar as suas personalidades. Quando lidamos com homens feitos, exige-se outro tipo de discurso.

Está preparado para ter apenas cinco dias de férias?

Estou tão envolvido nisto que ainda nem me dei ao trabalho de pensar nisso. Mas quem corre por gosto não cansa... Faço isto com tanto gosto que, para mim, estar com esta equipa é como estar de férias.

"Jogadores são sempre um pouco egocêntricos"

Foi jogador, agora é treinador. A perspectiva mudou muito?

É oposta. Enquanto jogadores, somos sempre um pouco egocêntricos. É normal, porque os jogadores querem jogar, pensam que são melhores. A perspectiva do treinador é mais abrangente e gerir um grupo com 24/25 jogadores nunca é fácil.

Há alguma situação em que tenha ficado chateado com uma opção de um treinador e que agora perceba melhor?

Tive muitas... Aliás, quando não jogava ficava sempre chateado com o treinador [risos]. Actualmente, quando digo os que vão jogar, aqueles que não são escolhidos olham sempre com cara de chateados como quem diz 'este tipo não percebe nada disto'. Ficava aquela azia momentânea, mas que passava rápido. No meu caso funcionava como uma motivação-extra. E este é um dos problemas de muitos jogadores: quando não jogam, começam a desleixar-se e a trabalhar mal, e quando surge uma oportunidade não estão devidamente preparados, acabando por dar razão ao treinador. Quem não joga tem de trabalhar ainda mais, para obrigar os que jogam a continuar bem, sob risco de perderem o lugar. Esta tem de ser a dinâmica de um grupo, ainda mais no FC Porto, que tem muitos jogos por época.”


EM
www.ojogo.pt

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